
Aos 80 anos, ‘Guerreira do Comércio’ segue enfrentando batalhas do dia a dia em sua loja
Na ‘Fios Dourados’, ela costuma manter jornada de trabalho em período integral; a pioneira vive aqui há 61 anos


Desde 1962, uma das esquinas mais valorizadas dos arredores da Praça Santos Dumont pertence ao casal de pioneiros Joaquim Lourenço Maria Rodrigues, 85 anos, e Cleide Secco Rodrigues, 80 anos. Nesse ponto comercial estão hoje a confeitaria ‘Magia dos Doces’ e a loja de aviamentos mais famosa de Umuarama, a ‘Fios Dourados’.
Dona Cleide conta que o local já acolheu loja de secos e molhados e depois de bebidas [pertencentes à família dela]; mais tarde, loja de calçados, de material de construção [aluguel]… Enfim, na dinâmica do crescimento da cidade, a paisagem ia mudando até que em 1986 ela decidiu que queria ter o próprio negócio. Até então ajudava o marido na loja dele e cuidava da casa.
Mesmo com as finanças da família equilibradas, pretendia empreender. “Queria mostrar que também sabia ganhar dinheiro”, diz, com a satisfação visível de quem conseguiu ganhar a aposta. “Tomei a decisão, fiz um empréstimo no Banco do Brasil e realizei o meu sonho”, conta a pioneira, que sabia fazer tricô e crochê, bordar e costurar. E foi essa habilidade por trabalhos manuais que a inspirou a investir nesse nicho de mercado.

“Percebi que Umuarama precisava de uma loja bem suprida nesse segmento pois tínhamos muitas costureiras atuantes; eu me alegro em poder dizer que acertei, pois logo precisei ampliar a loja… Em seis meses de funcionamento já tive que ampliar”, informa a empresária, que teve sua competência reconhecida. Ela foi contemplada com o prêmio estadual ‘Guerreiros do Comércio’, da Federação do Comércio do Paraná, em 2011.
Na conversa com OBemdito, Dona Cleide mostra-se altiva, empolgada com as lembranças que relata sobre sua trajetória no empreendedorismo: “Eu atendia o dia todo e à noite criava e costurava peças diversas, artesanais, para vender aqui na loja; foram muitas madrugadas adentro nessa rotina! Bem diferente de hoje, naquele tempo não tinha quase nada pronto!”.

Isso a intriga. Concorrer hoje com a avalanche de produtos prontos [a maioria de baixa qualidade] que vem da China é um dos motivos que faz comerciantes, do perfil dela, desanimarem. “Nosso movimento caiu muito”, lamenta a proprietária da ‘Fios Dourados’, sócia do filho Eduardo Lourenço Maria Rodrigues, 55 anos [ela tem mais dois filhos].
Com apoio de 10 funcionários, trabalha oito horas por dia, a maior parte do tempo no caixa, onde se sente mais potente. “Acordo pensando na loja, porque amo o que eu faço! Não uso calculadora para somar… Tenho uma cabeça ótima, raciocínio rápido!”, orgulha-se a ‘Guerreira’, que promete não abandonar o ‘front’ tão cedo.

“Vim de avião graaande!”
Dona Cleide chegou em Umuarama com 19 anos [logo que casou]. Era 1962. Ela e o marido, que é português, vieram de Mandaguaçu. “Cheguei de avião de carreira… avião graaande! E hoje temos avião igual àquela época? Não! Isso não é estranho?”, comenta, questionando o atraso da cidade em relação ao transporte aéreo.

Também se queixa de não ter continuado os estudos. Ela parou na ‘8ª série’ [completou o ginásio, hoje ensino fundamental]. E por que parou? “Queria muito ser professora, cursar o magistério [em nível de segundo grau], mas meu pai não me deixou; ele dizia que mulher não precisava estudar, bastava ser prendada”, responde, com ar de indignação.
Anos depois teve chance de continuar os estudos. E quando pensou em fazer uma faculdade, sofreu outra frustração: o marido não deixou. “Aceitei, me conformei nessas duas vezes, mas quando resolvi abrir minha loja… aí ninguém me segurou”, arremata a empresária, que sempre foi também muito atuante na sociedade umuaramense, principalmente no Rotary, o qual chegou a presidi-lo.


